22 de julho de 2010

A PESQUISA DO SORVERTE

Em um belo dia de quarta feira eu estava com o meu coorientador do doutorado, professor Aldemar Araújo Castro,  tomando sorvete num shoping center em Maceió. Após as mais variadas discussões sobre assuntos acadêmicos, resolvemos tomar um sorvete e ai neste momento me veio uma idéia brilhante que fiz questão de dizer-lheao mesmo tempo em que as palavras me vinham a mente.
Foi mais ou menos assim:
- Mestre, se um dia quiséssemos saber qual seria o melhor sorvete batido com refrigerante, a vaca preta ou a vaca dourada, teríamos que executar uma pesquisa, mas não seria de qualidade. 
- Primeiro, deveríamos conceituar a todos os participantes o que é a vaca preta e vaca dourada para que tudo fique transparente a todos os envolvidos. Vaca preta é uma solução batida no liquidificador preparada com sorvete, coca cola sem açúcar. A vaca dourada se prepara do mesmo jeito só que no lugar da coca cola se põe guaraná. Geralmente não se põe açucar e nunca se põe leite.
- A minha hipótese é que a solução mais gostosa na opinião de quase todos os participantes seriá o vaca preta porque quase todo mundo gosta de coca cola e nem todos gostam de guaraná. - Nesse momento parei para tomar um pouco d'água, como diz o mestre água com sabor de água, e continuei.
- Seria mais ou menos assim, uns 90% dos que experimenteassem a solução de vaca preta gostariam dela, porém se fosse o vaca dourada seriam uns 70% dos que fossem escolhidos para experimentar aquela solução. Considerando que os participantes em cada grupo só exprimentariam a solução daquele grupo eu manteria estas proporções, mas se por um acaso houvesse mudança de grupo essas proporções não seriam as mesma porque se o resíduo na boca poderia prejudicar a análise da segunda solução e asim prejudicar o resultado final da pesquisa.
- Ora, para que a pessoa não escolhesse o grupo para participar de acordo com o refrigerante de sua escolha seria realizado um sorteio com uma moeda honesta de dois lados, cara e coroa, sendo o sorteado para cara alocado para o grupo do vaca preta.
- Mas mesmo assim quando o participante visse o produto no copo da pesquisa ele saberia que a solução clara seria com guaraná e a solução escura seria com coca cola. O copinho seria o novo problema porque se o participante não gostasse de coca cola e caisse no grupo do copinho deste grupo mesmo que gostasse diria que o gosto não seria tão bom.
- Para resolver isso eu poria um copinho todo fechadinho, com canudos da mesma cor para todos os participantes e soluções de vaca preta ou dourada que ficassem sempre ao mesmo nível no copinho. O copinho seria de cor opaca, como se fosse um envelope amarelo das agências dos correios, para não se ver o conteúdo interno do copo tal qual ocorre com as cartas. Ai sim eu confiaria no resultado final. 
- Faltaria ainda saber uma coisa relacionada ao sorvete. O que poderia responder a minha pergunta da pesquisa que seria: qual o melhor refrigerante a ser utilizado em associação com o sorvete, coca cola ou guaraná ou qual a solução mais saborosa quando se associa sorvete com refrigerante?
- Acho que para responder isso valeria uma avaliação do gosto, ou do paladar, ou o sabor, ou. Bem já sei ... Seriam dois grupos de participantes onde um referirá seu paladar após saborear o vaca preta e o outro após saborear o vaca dourada. Seria uma pesquisa com respostas dicotômicas: gostei ou não gostei.
- Como são dois grupos constatei que são necessários pelo menos 42 participantes em cada grupo. - Enquanto fazia a análise no papel já falava o que estava pensando no resultado. - Este número representa 1 chance em 20 do resultado ocorrer ao acaso e 80% ou mais de achar o resultado se ele relamente existir. Usei uma fórmulazinha rápida que aprendi no meu mestrado ao contrário de alguns estatísticos que me responderiam de imediato que para cada variável que se quer analisar e que possa responder a pergunta da pesquisa seriam necessários no mínimo 10 e no mácimo 15 participantes. Eu também poderia fazer da forma mais rebuscada usando aplicativos e fórmulas tal qual fiz com a pesquisa do professor Amauri, mas iria me consumir muito tempo.
- Como teste estatístico de hipóteses eu escolheria o teste do qui-quadrado, pois, serveria para analisar duas proporções e a relação de dependência entre as características dos participantes. Eu utilizaria uma tabela 2X2 da estatística
- Só não participaria quem fosse alérgico a sorvete, aquele que tivesse acabado de tomar sorvete ou picolé ou que fosse menor de idade porque não pode assumir a responsabilidade de chupar sorvete e dar um testemunho verdadeiro sobre o sabor do sorvete sem a permissão dos pais.
- Bem só faltaria agora saber quanto eu gastaria nesta pesquisa, quem seriam os participantes e como os convidaria a participar, onde a realizaria, como e para quem iria divulgá-la e qual a importância desta pesquisa.
Após pensar alguns minutos e esvaziar o copo de vaca preta continuei:
- Para saber quanto eu gastaria nesta pesquisa deveria pesar este  produto que estou saboreando e o que você tem nas mãos e ver quanto nós pagamos e dividir pelo peso da solução. Acredito que em cada copo da pesquisa eu só poria 150 ml de sorvete. Seria 150 ml para poder a pessoa saborear bem. O ideal seria pedir patrocínio, a FAPEAL não acha, ou a qualquer empresa interessada.
- Bem, quem seriam os participantes e como eu os convidaria a participar? Qualquer pessoa que adentrasse no shoping é um potencial candidato, mas acho que eu os convidaria por meio de anùncios no alto falante do shoping. Os anúncios ocorreriam a cada 30 minutos durante os sete dias de uma semana qualquer durante o ano. Aqueles 84 que se apresentassem primeiro seriam os selecionados.
- Onde eu a realizaria, eis a questão! Em qualquer shoping center. Agora,  o local específico seria dentro do shoping e no local mais central onde todos pudessem ver minhas alunas com os copinhos de sorvete nas mãos.
- Como e para quem iria divulgá-la? Para todos os amantes do sorvete, ou seja, o mundo todo.
- E a importância médica desta pesquisa seria pelo seguinte motivo. O principal. e que ainda não contei esta faze da pesquisa. Todos os participantes seriam contactados por telefone com 30, 60 e 90 dias para saber se os mesmos desenvolveram algum tipo de doença respiratória e assim elucidar qual o grupo que foi mais ou menos beneficiado por ter tido menos infecção após tomar o sorvete. De posse desta informação com este acompanhamento qualquer revista científica publicaria minha pesquisa.
- Mestre, o que você acha?
A única coisa que o mestre me disse após o final de toda a explanação foi que já fizeram esta mesma pesquisa na Europa e já a publicaram só que foi com vinhos para saber se os melhores vinhos eram mesmo os franceses ou de outro lugar.
É, foi uma pena que eu não tenha tomado este sorvete antes dos europeus.

Se você é aluno de medicina ou mesmo da área de saúde click aqui para testar seus conhecimentos.

3 comentários:

  1. Timbó,

    O que é o sorvete? Gostaria de uma definição para não atribuir a outros alimentos o nome de sorvete.

    Nesta fase do planejamento da pesquisa três itens me preocupam:

    1) Qual será a variável primária?

    2) Quem irá quantificar a variável primária: os consumidores ou os avaliadores, preliminarmente treinados e calibrados.

    3) A amostragem. Caso empregue os consumidores, faria levando em consideração a idade, o sexo, a escolaridade e o nível de renda. Uma amostra estratificada pelos quatro itens citados acima.

    Segue algumas observações sobre a avaliação do café, do vinho e dos perfumes que podem ser úteis na sua pesquisa.

    Para o café, foi criado a avaliação das características sensoriais da bebida com oito itens: aroma, acidez, amargor, sabor, sabor estranho, adstringência, corpo, qualidade global (http://www.abic.com.br/arquivos/leg_resolucaoSAA28_jun07.pdf)

    A Qualidade Global da Bebida do Café é a percepção conjunta dos aromas e dos sabores característicos do café; do equilíbrio entre a doçura e o amargor, da harmonia da bebida, do corpo, tudo se traduzindo numa sensação agradável durante e após a degustação. Isso também pode ser aplicado ao sorvete?

    No café, segue o texto extraído da resoluão SSA-28:

    "Para a avaliação da Qualidade Global, utiliza-se uma prova de xícara feita com o produto final, isto é, o café torrado e/ou moído.Os cafés são preparados em infusão com o uso de filtro de papel, usando-se a diluição de 10 g. de pó de café para 1,0l. da bebida, a partir das amostras recebidas e que estão codificadas ou caso o café seja para “espresso”, utilizar preparação conforme máquina de café “espresso”. Os avaliadores, em grupos de 4 ou 5 especialistas, provam as amostras codificadas (teste absolutamente cego) usando-se como referência uma amostra previamente preparada de um café de qualidade conhecida. A avaliação nunca deve ser feita por apenas 1 ou 2 provadores, para tornar o resultado mais objetivo.
    Os avaliadores, preliminarmente treinados e calibrados, avaliam o conjunto dos atributos da amostra, em procedimento tradicional de prova de xícara (aspirar/degustar/descartar) e atribuem o seu conceito de Qualidade Global na Ficha de Avaliação, usando-se uma escala linear de 0 (zero) a 10 (dez), onde zero representa um café muito ruim e dez representa um
    café excelente; A prova é feita por repetição para o mesmo grupo e, finalmente, é calculada a média das avaliações, isto representando a Qualidade Global das amostras"

    Resolução SAA - 28, de 1-6-2007 Define Norma Técnica para fixação de identidade
    e qualidade de café torrado em grão e café torrado moído

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  2. (Continuação)

    No vinho, a avaliação tem seu ritual próprio. A degustação deve ser feita em um lugar neutro e bem iluminado. Use os olhos, o olfato e o paladar, nesta mesma ordem, para provar e avaliar um vinho.

    - Limpe o paladar com àgua entre vinhos.
    - Tome notas de suas impressões de todos os vinhos.
    - Não coma nada antes nem durante uma prova.
    - Não use perfumes: outros aromas são intrusos.

    ...

    Nos perfumes, a história é ainda mais sútil (http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/9/9139/tde-26022009-102032/publico/Cap1.pdf).

    A avaliação de um perfume é muito subjetiva, pois o aroma só começa a existir realmente em contato com a pele, uma vez que a mistura passa por uma evolução, sendo notada em três fases, chamadas "notas". NOTA TOP: é a primeira impressão e dura alguns segundos. É o cheiro que sentimos assim que passamos a fragrância. NOTA CORAÇÃO: é a alma do produto, desenvolve-se após a aplicação e dura horas, mantendo suas características básicas. É o odor que sentimos durante um bom tempo.
    NOTA DE FUNDO: quando a fragrância se fixa ao corpo, dá-se a liberação dos elementos mais fortes. Os efeitos podem se acentuar ou diminuir, de acordo com a temperatura do corpo, clima e ambiente. É o que expressa o caráter básico da fragrância.

    Por tudo que foi exposto, gostaria de uma descrição mais detalhada de todo o planejamento da pesquisa. A ideia brilhante é viável e relevante; o plano de intenção, continua sendo viável e relevante; as outras fases do planejamento precisam ser executadas para que possa ser avaliado se ainda manterá a relevância e a viabilidade.

    Neste meio tempo vou continuar a apreciar o sabor do sorvete batido com leite e o iogurte batido com frutas!

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  3. Timbó,

    Quando me referi ao nível sócio econômico, por favor, leia: Critério de Classificação Econômica Brasil (CCEB) disponível no sítio: http://www.abep.org/novo/Content.aspx?SectionID=84

    Abraços,

    Aldemar

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